Oclusão Dentária. É sempre normal?  

IMAGEM ILUSTRATIVA DE UM SORRISO

Por vezes ouvimos dizer que certas crianças não têm uma cara “muito agradável”, ou têm certas características porque “já nasceram assim”, ou “saem ao pai/mãe que também eram assim” e depois “voltaram ao normal”, ou ainda “são assim porque Deus os fez assim e por isso são perfeitos”.

Sendo completamente correto que cada pessoa é como é e deve-se sentir bem com a forma como é, também é igualmente verdade que existem perfis mais ou menos típicos e que esses perfis, com maior ou menor grau de funcionalidade, podem ou não levar a diferentes noções acerca do que é ou não é patológico.

Falamos agora sobre a oclusão dentária.

A oclusão dentária é nada mais nada menos do que a forma como os dentes superiores se articulam nos dentes inferiores nas várias posições e movimentos mandibulares. Para que exista uma oclusão típica/normal, é necessário o funcionamento harmónico, saudável e sem dor, de várias estruturas como dentes, músculos e articulações sob o controlo neuromuscular (Pimenta, (2018) cit. Por Hassan e Rahimah (2007)).

Se é certo que existe uma oclusão normal, então é possível concluir que nem sempre é assim. Quando isso acontece, atribuiu-se o nome de maloclusão. Segundo a American Association on Orthodontists, esta patologia é definida como um desvio relativo à oclusão normal, na relação intramaxilar e/ou intermaxilar (2012). Para a Organização Mundial de Saúde este é já o terceiro maior problema da saúde oral (Carneiro, Rodrigues, Araújo, Jardim, & de Lima, 2021 cit. Brandão AMM, et. al. (1996)).

Esta condição afeta a arcada dentária, o esqueleto facial ou ambos, resultando em problemas estéticos, dentários e funcionais (Carneiro, Rodrigues, Araújo, Jardim, & de Lima, 2021 cit. Sousa JP, Sousa SA. (2013)). De uma forma mais simplista, tem que ver essencialmente com a forma como a mandíbula, a maxila e as respetivas arcadas dentárias se relacionam (Figueiredo, Feitosa, Gonçalves, & Alves, 2019)).

Se tudo isto lhe parece algo abstrato, na figura 1 pode perceber como é, aos olhos da ciência, uma oclusão normal, e na figura 2, exemplos de uma mordida menos típica. Estas podem ser enquadradas de acordo com uma classificação denominada de Classificação de Angle, a qual se encontra dividida em 3 classes.

Figura 1: Oclusão dentária normal
Figura 2: Divisão de Angle
para classes de mordida

Dentro do mesmo paradigma, não se deve atentar exclusivamente a este tipo oclusão, já que existem outros tipos de mordida que as crianças podem apresentar. Não se preocupe, caro leitor, isto vai parecer ficar complicado e com nomes muito estranhos e confusos, mas vai ver que é mais claro do que parece à primeira vista!

Passando ao esclarecimento, as mordidas podem ser de vários tipos, nomeadamente:

Figura 3: Exemplo de mordida normal
Figura 4: Exemplo de mordida aberta
Figura 5: Exemplo de mordida profunda

Figura 4: Exemplo de mordida aberta (ocorre quando não existe contacto entre os dentes superiores e inferiores impedindo uma correta oclusão)

Figura 5: Exemplo de mordida profunda (ocorre quando existe em sobreposição exagerada dos dentes superiores sobre os inferiores)

Figura 6: Exemplo de mordida cruzada
Figura 7: Exemplo de apinhamento dentário
Figura 8: Exemplo de Diastema

Figura 6: Exemplo de mordida cruzada (ocorre quando os dentes superiores se sobrepõem claramente aos inferiores em determinadas zonas da arcada dentária)

Figura 7: Exemplo de apinhamento dentário (ocorre quando não existe espaço para a correta localização de todos os dentes)

Figura 8: Exemplo de Diastema (ocorre quando existe excesso de espaço entre os dentes, que é reflexo de um tamanho pequeno dos dentes comparativamente ao espaço ósseo existente)

Figura 9: Exemplos de perfis Prognata
Figura 10: Exemplo de perfil Retrógnata

Figura 9: Exemplos de perfis Prognata (ocorre quando os dentes da mandíbula (arcada inferior) ultrapassam os dentes da maxila (arcada superior))

Figura 10: Exemplo de perfil Retrógnata (ocorre quando o maxilar cresce muito em relação à mandibula, tornando mais evidente o queixo da pessoa mais retraído e o nariz mais proeminente)

Com certeza, o caro leitor já concluiu que nem todos os perfis são típicos e que os que não o são têm classificações nas quais que podem ser enquadrados. Acredito também que, melhor ou pior, consegue já distinguir e discriminar estes mesmos perfis atípicos. Seguindo este raciocínio, poderá estar a perguntar-se: Sim, já percebi que existe uma coisa chamada maloclusão e também que é dividida tendo em conta várias características, mas… Como é que as posso evitar o mais rápido possível? E há algum tipo de tratamento?”

A resposta é: Sim, mas já lá vamos… Saiba primeiramente que esta problemática surge devido à conjunção de vários fatores, tanto genéticos como ambientais (Carneiro, Rodrigues, Araújo, Jardim, & de Lima, (2021) cit. Van Der Linden FPMG. (1966), Almeida RR, et al. (1998), Silva Filho OG et al. (2003), Silva Filho OG et al. (1991), Rebello Júnior W. (1991)) e, assim sendo, conseguimos determinar em certa medida o aparecimento ou proeminência destas características. Entre os fatores ambientais estão, por exemplo, o surgimento de cáries dentárias, hábitos de sucção não-nutritiva estabelecidos por longos períodos, rotinas incorretas na alimentação, posicionamento e função anormais da língua, e ainda posturas corporais incorretas ou alterações do trato respiratório superior, quer na sua estrutura como na sua função como, por exemplo, quando existe rinite alérgica ou hipertrofia das adenoides (Figueiredo, Feitosa, Gonçalves, & Alves, (2019)) cit. Corrêa MSNP (2011), Graco A. et al. (2015), Lopatiene K. et. al (2013)). Estes últimos desencadeiam padrões de respiração predominantemente orais o que, de acordo com a literatura à data, são os que mais potenciam o aparecimento de maloclusões (Figueiredo, Feitosa, Gonçalves, & Alves, (2019) cit. Imbaud TCS et al. (2016), Souki BQ et al. (2009), Pacheco MC et al. (2015)).

Com tantos fatores a ter em conta e devido ao facto dos pais e mães não serem super-heróis e terem todo o conhecimento do mundo, pode-se perfeitamente não ter o «olho» suficientemente treinado para detetar todas estas situações. Desta forma, deixo a sugestão para que não se agarrem à análise de todos estes perfis nas crianças que gostam ou eventualmente com as quais trabalham e estejam mais atentos a comportamentos como a sucção digital, comummente conhecida como “chuchar no dedo”, sucção de chupeta, sucção e mordida do lábio (que é mais facilmente identificável quando existem marcas ao redor da boca), sucção de outros objetos como lápis, má postura enquanto a criança dorme e/ou quando está acordada, bruxismo e/ briquismo (nomes dados aos movimentos que se fazem quando ocorre pressionamento das arcadas dentárias uma contra a outra podendo movimentá-las para a frente e para trás), a onicofagia (também conhecida como “roer as unhas”), a projeção da língua para a frente, a colocação da língua em cima dos dentes que se encontram na arcada dentária inferior e a manutenção da boca aberta por longos períodos de tempo (Silva, 2006). Existem mais, mas caso consiga estar a atento a todos estes, está de parabéns! A não ser que a sua profissão já lhe exija ter este conhecimento.

Agora que já sabe ao que estar atento, saiba que tratamento das maloclusões deverá tender a ser realizado através de uma análise multidisciplinar, envolvendo não só dentistas, médicos, terapeutas da fala e psicólogos (Carneiro, Rodrigues, Araújo, Jardim, & de Lima, 2021) mas também fisioterapeutas e nutricionistas (Limal, Amorim, Diatrich, Coury de França , & Caixeta, 2021). Figueiredo, Feitosa, Gonçalves, & Alves (2019) vão mais além e indicam que um acompanhamento desta ordem é imprescindível, sublinhando que quanto mais precoce for a deteção e intervenção nestes casos, mais favorável é o prognóstico. Mas se é daquelas pessoas que não fica satisfeita com informações genéricas como “deve ser o mais cedo possível” e precisa de uma data concreta para decidir se deve fazer algo em relação a algum caso que lhe está a sucitar dúvida, não deixe passar a faixa etária dos 3-4 anos. Aquilo que a literatura nos indica é que a remoção de hábitos nefastos deve acontecer no máximo até esta idade, já que parece existir uma autocorreção ou redução das alterações do sistema estomatognático, evitando o desequilíbrio das estruturas e funções deste.

Pedro Barros, Terapeuta da Fala

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